Por Geraldo Elísio

Já ocorreu há alguns dias. Não importa. A Cantina do Lucas a qualquer tempo esteve, está e estará na vida de Belo Horizonte, Capital do estado brasileiro de Minas Gerais. Agora com 60 anos e histórias transcendentais de ter parte ativa em importantes mudanças no visual e, principalmente, comportamento social e cultural desta que já foi chamada Cidade Jardim.

Corria o ano de 62 quando Humberto e Salvatore de Monda resolveram dotar a provinciana capital da Tratoria de Saatori – ali permanecendo até 1965 – quando foi vendido para José Lucas que entendeu melhor o lugar passar a se chamar Cantina do Lucas, com o acréscimo de seu segundo prenome, estabelecimento que em 69 foi comercialmente transferido para o Clênio.

Entretanto parece o destino, o comércio e a história queriam mais e vislumbraram O Edmar Roque para gerir o ponto histórico em um dos momentos mais marcantes da história brasileira quando o golpe militar de 64 já atingira o seu auge e do ponto histórico e geográfico onde se encontrava já podia divisar sinais da redemocratização ocorrida depois de 25 anos.

Contudo era ainda muito distante o novo milênio impossibilitando aos brasileiros divisar o novo golpe constante do programa e liderado pelo “Coiso” Jair Bolsonaro. Edmar assumiu e ampliou a tradição luqueana de sequenciar as mudanças e ampliar o aspecto cultural que até hoje persiste, mesmo tantos e tantos tendo partido para outros paramos.

Desta ação se beneficiaram todas as vertentes culturais, pois a Cantina do Lucas em sua trajetória somente se viu prestigiada por escritores de todos os naipes, músicos, gente do teatro, do cinema, do balé, artes plásticas, jornalistas, professores universitários e alunos, políticos notadamente de esquerda, bem como históricos líderes de movimentos resistentes formados por dirigentes históricos bem e guerrilheiros (as) a de naipe histórico.

Milton Nascimento (Bituca) e o Clube da Esquna, Clara Nunes, Chanina, Inimá de Paula, Fernando Brant, Petrônio Bax, YaraTupinambá, Nilson Azevedo, Pedro Paulo Cava, Aroeira, Fernando Brant, Geraldo Magalhães, Roberto Drummond, Heloisa Duarte, Procópio, Luciene Marzagão, Geraldo Carrato, Toninho Horta, José Maurício Vidal Gomes, Zé Maria Rabelo, Dinorá do Carmo, Felipe Drummond, Carlos Felipe, Lina Lapertosa, os irmãos Pederneiras, Gilú, advogados, Murilo Rubião, Geraldo Alves, Isaias Golgher, Álvaro Hardy, Fritz Teixeira de Salles, Ângela Carrato, Sofia Diniz, Álvaro Apocalipse, Jota D’Ângelo – mínimo minimorum – cujas digitais estão gravadas naquelas paredes.

E com eles Chico Buarque de Holanda, Zézé Mota, MercedezSosa – com quem eu tive o prazer de jantar-, Paulo Autran, Tonia Carrero, também com as digitai lá gravadas e nas memórias dos frequentadores,também uma pequena citação porque nomear a todos implica em escrever outros livros de muitas páginas nesta história radical de mudança do que era o provincianismo para a Belo Horizonte atual.

E o Edmar Roque segurando barras. Capítulo “especial para o garçom símbolo” e mais famoso de Belo Horizonte, Olímpio Perez Munhoz, o “Anjo Anarquista” e suas advertências de que a casa por momentos estava infestada da repressão e dedos duros; “Hoje não temos filé a cubana” e “Salada russa está em falta”. E o humor do jornaleiro Tostão a anunciar manchetes que alguém – principalmente os jornalistas Tatá Madureira ou o Ronaldo Solha liam para ele. Querem um exemplo: “Santa Ceia adiada pela crise do óleo de soja”.

Edmar Roque segurando as pontas e criando novas delícias de um cardápio até hoje farto e apreciadíssimo. Pessoalmente o pequeno Arthur, Janaína e eu – três gerações – preferimos o parisiense, Janaína sempre solicitando que o talharim vegetariano.

Pilotando o atendimento ao público para nos saciar a fome, lembramo-nos de todos que já partiram memórias vivas e atuais, em especial Deco, Nonô, Piazza, Geraldinho. Na cozinha entre saudades e vivos e vivas Shirlei, Cardoso, Clotilde, Andreza,Orlandina e Tercina, a retaguarda impávida dos famintos.

Mas veio um tempo de tristeza com a partida de Edmar, sequenciado em seus propósitos por dona Maria Xavier Cunha Roque, Elisa, Ana Luiza e Maria Leonor. Eles seguraram a barra e ainda tiveram força para vencer a pandemia, mantendo – via segredos da Cantina do Lucas – a história em andamento. Foi criado um serviço de entrega domiciliar. Sem esquecer Marcia, Ângela, Silvany, Sandra. Angêla, Patrícia, Geraldo e Elza.

E os domadores de glutões e beberrões Marciley, João Victor, Rivelino, Resende, César, Nunes, Dino, Luiz, Alisson, Mourão e Paulo, faltando Cristiane, Juliano e Carlos Ferreira Neto, o Carlinhos. O final de festa sempre a recomeçar no dia seguinte com a passagem onde sempre estão a postos com elegância e fidalguia, Norberto, Ana Maria e João Vitor.

Agora é só aguardar a chegada do primeiro centenário da Cantina do Lucas.