Uma das pautas que não sai da boca do presidente Jair Bolsonaro (PL) é a suposta fragilidade das urnas eletrônicas, como forma de deslegitimar o processo eleitoral brasileiro. Na mesma linha, o assunto também é dominante nos grupos de extrema-direita do Telegram.

Letícia Cesarino, professora no Departamento de Antropologia e no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), estuda a fundo o comportamento bolsonarista em grupos, e aponta: “os [assuntos] mais compartilhados, as pautas e as narrativas que se sobressaem no conjunto dos grupos e canais que a gente analisa, têm a ver não necessariamente com alegação direta de fraude nas urnas, mas com a deslegitimação da institucionalidade que garante o resultado da eleição”.

“E é justamente a extrema-direita, aliada do presidente Jair Bolsonaro, que domina esse ambiente. Nessas plataformas mais subterrâneas, como o Telegram, é dominância total da direita. O modo como eles se vendem, como produtores de conteúdo, tem a ver com estar revelando verdades que a mídia esconde. E é assim que eles ganham fidelidade desses seguidores”, complementa.

A ideia de “revelar a verdade” também dá a tônica da atuação de Bolsonaro. Em julho do ano passado, o capitão reformado prometeu apresentar provas de que suposta fraude no sistema eleitoral durante o pleito de 2018. Na época, o hoje presidente disse que, na verdade, teria vencido o pleito já no primeiro turno. Logo depois, no entanto, a “verdade” revelada não passou de alegações antigas e falsas de que as urnas eletrônicas completaram o voto no número do PT à revelia da escolha dos eleitores.

Brasil de Fato: Das eleições presidências de 2018 para cá, o que mudou em relação à produção e difusão de desinformação nas redes sociais no Brasil, principalmente pensando na extrema-direita?

Letícia Cesarino: A máquina está funcionando a todo vapor, mas tem um aspecto diferente de 2018, quando teve um caráter expansivo. Depois da facada, ela [a máquina] conseguiu uma expansão e capilaridade para além daqueles grupos segmentados e influenciadores mais raiz do bolsonarismo. Através do WhatsApp, principalmente, se vê uma capilaridade muito grande para campanha.

Este ano, em se tratando de reeleição, com quatro anos de governo, pandemia, a volta do Lula para a corrida eleitoral, o bolsonarismo está em um momento ruim. O ecossistema foi diminuindo de tamanho em comparação ao que chegou a ser na campanha. Mas, ao que tudo indica, eles estão “repivotando” a máquina para eleição em si, como eles fizeram em 2018.