Por Sylvia Colombo

O deputado argentino Máximo Kirchner, filho da vice-presidente Cristina Kirchner, anunciou na segunda-feira (31) que deixará o posto de líder do bloco governista na Câmara dos Deputados. A renúncia, segundo ele, se dá por discordar do acordo costurado por Alberto Fernández com o Fundo Monetário Internacional, anunciado na semana passada.

“Não apoio a estratégia usada [pelo governo] e muito menos os resultados obtidos na negociação com o FMI, levada adiante exclusivamente pela equipe econômica”, disse Máximo em uma carta aberta. “Nunca deixei de expor minha visão […], mas é melhor dar um passo para o lado para que, assim, ele [Fernández] possa indicar [como líder] alguém que acredite nesse programa do FMI.”

Na mensagem, o parlamentar destaca que tomou essa decisão pensando “não só a curto prazo mas também olhando para 10 de dezembro de 2023”, em referência à data da próxima eleição presidencial.

O acordo argentino com o FMI foi criticado por parte da população, em protestos de rua, e também não conta com aprovação total de Cristina. A Argentina deve US$ 44 bilhões (R$ 236,7 bi) ao fundo, sendo parte desse montante resultante de uma dívida contraída na gestão anterior, de Mauricio Macri.

As negociações para o pagamento estiveram entre os elementos centrais de uma crise entre o presidente e sua vice, agravada ainda pelo mau resultado dos candidatos do governo nas primárias das eleições legislativas de meio de mandato, no segundo semestre do ano passado. Em novembro, na eleição em si, o peronismo perdeu o controle do Senado e manteve uma ligeira maioria na Câmara.

Nesta segunda, Fernández agiu rapidamente para tentar pôr panos quentes após o anúncio de Máximo. Ao canal C5N, ele negou a possibilidade de uma nova crise no governo e sublinhou que a própria Cristina tinha restrições à renúncia do filho como líder na Câmara.

O presidente ainda disse que deve anunciar o novo ocupante do posto nesta terça (1º) e ressaltou que o acordo feito “foi o melhor possível”.

“Cristina também tem matizes com relação ao acordo com o Fundo Monetário Internacional, mas o presidente sou eu”, afirmou. “No cenário atual, um calote seria um problema enorme, seria sair do jogo. É como se estivéssemos jogando uma partida de futebol e me tirassem do campo. A lógica dos organismos multilaterais de crédito impõe cumprir certas regras.”

Uma crise parlamentar é tudo de que o governo não precisa nesse momento, aliás. Isso porque o acordo com o FMI, costurado pelo ministro Martín Guzmán, ainda tem de ser aprovado pelo conselho do fundo e depois pelo Congresso argentino. Quando anunciou o acerto, o presidente inclusive dirigiu um pedido à oposição para que facilite o andamento das negociações.

Alguns detalhes do acerto, porém, ainda não estão claros. Fernández, por exemplo, afirmou que não haveria ajustes, mas o FMI contempla o de alguns itens, como os subsídios à energia. No mais, a Argentina se compromete em redução fiscal e na redução da emissão monetária.

Na sexta (28), o país cumpriria o pagamento da parcela da dívida que vencia naquele dia, de US$ 731 milhões (R$ 3,9 bi). Em março ocorre o principal vencimento, cujo valor ainda está em negociação. Foi acordada uma redução gradual do déficit fiscal, para chegar a 0,9% em 2024. Em 2022, a meta é chegar a 2,5% do PIB. O país também se comprometeu a reduzir a emissão monetária, recurso amplamente utilizado durante os primeiros meses da pandemia, para aliviar o impacto na economia.

O programa acordado com o FMI durará dois anos e meio, e a cada três meses haverá revisões.

Novos protestos contra o fundo estão sendo convocados por movimentos sociais, que prometem marchar também em oposição à Suprema Corte argentina. Nesta terça, Fernández parte em viagem para a Rússia e para a China.

Máximo, na Câmara desde 2019 e influente principalmente entre os grupos mais à esquerda —ele é líder do movimento La Cámpora—, ressaltou que vai continuar integrando o bloco governista, “de forma a facilitar a tarefa do presidente e de seu entorno”.

Fonte: Folha de São Paulo


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