O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) efetuou o pagamento de R$ 7,1 bilhões em emendas parlamentares em um intervalo de apenas dois dias, com o objetivo de destravar a tramitação do pacote fiscal no Congresso Nacional. A liberação dos recursos, que estava suspensa, ocorreu após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Com a medida, o Palácio do Planalto pretende garantir a votação de dois projetos essenciais do pacote fiscal ainda nesta semana. As propostas incluem mudanças nas regras de acesso ao Bolsa Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), além da redução do ganho real do salário mínimo e da ativação de gatilhos do novo arcabouço fiscal para conter despesas.
Outra proposta integrante do pacote é uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata de alterações no abono salarial, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e na regra que obriga a execução integral do orçamento aprovado pelo Congresso. Contudo, segundo as negociações atuais, a apreciação desta PEC deverá ficar para 2025.
Paralelamente, o governo espera avançar na votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA), fundamentais para regular os gastos do próximo ano. A Comissão Mista de Orçamento (CMO) já pautou a LDO para esta terça-feira, dia 17. No entanto, ainda há incertezas quanto à votação da LOA. Enquanto isso, o Congresso Nacional segue pressionando o Executivo por mais recursos.
Os R$ 7,1 bilhões pagos pelo governo na quinta-feira (12) e na sexta-feira (13) contemplam emendas individuais, indicadas por deputados e senadores para suas bases eleitorais, e emendas de bancada, que beneficiam Estados inteiros. Esses recursos têm caráter impositivo, ou seja, o governo é obrigado a liberá-los conforme definido pelos parlamentares no orçamento.
Desse montante, R$ 3,2 bilhões foram destinados a emendas “Pix”, modalidade em que os valores são transferidos para Estados e municípios sem uma destinação pré-definida. Esse mecanismo, revelado pelo jornal *Estadão*, é alvo de críticas pela dificuldade de fiscalização. Apesar de o STF ter determinado maior transparência, uma exceção foi aberta para os repasses deste ano, o que significa que os valores já foram depositados sem detalhamento público de sua aplicação.
Prefeitos têm até 31 de dezembro para apresentar planos de trabalho indicando como pretendem usar os recursos. O governo federal, por sua vez, terá até o início de fevereiro para avaliar esses planos e poderá rejeitá-los, mas, na prática, os valores já poderão ter sido gastos.
Além das emendas impositivas, o Executivo liberou R$ 1,3 bilhão adicional em recursos do Ministério da Saúde, destinados a hospitais e clínicas especializadas. Essa verba, gerida diretamente pelo governo, também é considerada parte das negociações para assegurar apoio à pauta governista no Congresso, especialmente na reta final do ano legislativo.
Apesar dos repasses expressivos, o clima no Congresso Nacional ainda é de insatisfação. Parlamentares cobram a liberação de R$ 8 bilhões em emendas de comissão que permanecem retidas. Esses recursos, herança do chamado “orçamento secreto”, são controlados pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP). No modelo atual, a identidade dos parlamentares beneficiados fica oculta, o que levou o STF a exigir que apenas emendas com padrinhos identificados sejam pagas.
Nos bastidores, articuladores do governo indicaram que o pagamento dessas emendas deve ocorrer apenas após o encerramento dos trabalhos legislativos, previsto para sexta-feira, dia 20. Essa postura irritou deputados e senadores, que têm enviado ofícios ao governo para identificar as emendas de sua autoria, na expectativa de que os recursos sejam liberados antes da votação do pacote fiscal.
Arthur Lira prometeu ao Executivo colocar o pacote fiscal em votação na Câmara ainda nesta semana. Contudo, deputados da base e da oposição manifestaram insatisfação com a condução do presidente da Casa. Segundo apuração do *Estadão*, Lira tem negociado diretamente com o governo e pautado projetos sem discussão prévia, o que tem gerado queixas entre os parlamentares.
A insatisfação aumentou quando Lira suspendeu as atividades das comissões permanentes da Câmara, priorizando a pauta do plenário. A decisão impediu que as comissões deliberassem sobre a destinação das emendas travadas, abrindo caminho para que o governo negocie diretamente com os deputados. Essa estratégia, conduzida sob a liderança de Lira, tem sido vista como uma manobra para acelerar a liberação dos recursos e garantir apoio às votações.
Um ponto de impasse é a decisão do Supremo Tribunal Federal, que determinou que as comissões parlamentares definam a destinação das emendas com transparência. Contudo, o governo encontrou uma brecha na decisão do ministro Flávio Dino, emitida no dia 2 de dezembro, que permite negociar diretamente com os parlamentares.
A medida gerou preocupação dentro do Executivo, onde servidores temem ser responsabilizados futuramente por autorizar pagamentos que não sigam rigorosamente a decisão do STF.
Apesar das tensões, o governo mantém a expectativa de que os pagamentos já efetuados e as promessas de novos repasses serão suficientes para garantir apoio ao pacote fiscal. Caso contrário, há o risco de que a votação das reformas e das leis orçamentárias se arraste para 2025, comprometendo o planejamento financeiro do governo para o próximo ano.
Foto: Roque de Sá/Agência Senado