O chefe da Terceira Seção do Estado-Maior da Polícia Militar de Minas Gerais, tenente-coronel Ricardo Novais, anunciou que a Ouvidoria da corporação vai instaurar procedimento investigatório para apurar possíveis excessos cometidos por policiais em 11 de setembro deste ano. Nessa data, militares cumprindo ordem judicial, teriam jogado gás lacrimogêneo e de pimenta, além de atirarem balas de borracha em moradores da comunidade de Vargem da Lua, em São Gonçalo do Rio Abaixo (Região Central).
As informações foram divulgadas, nesta quarta-feira (18/10//23), em reunião da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativo de Minas Gerais (ALMG).
De acordo com falas de participantes da reunião, a PMMG agiu a mando da Vale, que promoveria mineração ilegal em território que pertence a membros dessa comunidade. Segundo eles, a Vale está proibida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais de minerar na área. Ausente na audiência pública e criticada por isso, a empresa, segundo Ricardo Novais, buscava fazer reparos em tubulações de abastecimento de água da Mina de Brucutu, que pertence à empresa.
Mesmo reconhecendo a importância da providência informada pelo comandante, a deputada Beatriz Cerqueira (PT), que solicitou a reunião, questionou alguns aspectos apresentados por ele. O militar afirmou que antes do cumprimento da ordem judicial, a PM realizou uma reunião para tentar o diálogo entre membros da Vale e da comunidade, mas só compareceram funcionários da empresa.
Depois de ter acesso à ata da reunião do dia 11/9, a parlamentar disse que na ocasião a própria PM avaliava que o cumprimento da ordem judicial poderia ter um desfecho ruim. Questionou ainda o fato de logo após a reunião, a PM já ir para a comunidade.
“Se este é o procedimento padrão, temos que discutir; parece que foi mais um procedimento protocolar do que uma tentativa de mediação.” Afirmou a dep. Beatriz Cerqueira.
Ela também perguntou ao tenente-coronel se ele conseguia perceber o desnível entre o poder de uma empresa como a Vale, com funcionários altamente qualificados, e pessoas humildes da localidade. “Como aquela comunidade simples conseguiria acionar rapidamente um advogado? Isso deveria ser percebido pela Polícia Militar. Essa tentativa de reunião mostra essa desigualdade”, atentou.
Leandro Viana, advogado da comunidade, lembrou que desde 2019, vem obtendo vitórias na Justiça e, no entanto, a situação dos moradores só piora. Destacou que há cerca de 280 pessoas na Vargem da Lua, herdeiras do sr. Norberto ou compradores de partes do terreno que este adquiriu em 1941.
Em 2005, a Vale começou a minerar na região e em 2008, abriu estrada dentro dos terrenos. Incomodados, os proprietários entraram com ações na Justiça, que até hoje não foram finalizados.
Já um outro processo, afirma ele, obteve decisão favorável, transitado e julgado em 2012, proibindo a Vale de exercer qualquer atividade minerária em Vargem da Lua. Segundo o Viana, a empresa promoveu a invasão em terrenos dos moradores numa área de mais de 35 hectares. Apesar da decisão judicial, a Vale continua minerando no local.
O advogado registrou que, em fevereiro de 2019, a Vale acionou a PM para conter o que seria uma invasão de membros da comunidade à Mina de Brucutu. De acordo com Viana, a PM, como se trabalhasse para a empresa, levou “um batalhão inteiro para prender os moradores, inclusive crianças”.
Doze moradores foram levados à Delegacia de Itabira (Região Central), onde o delegado, após a averiguação de um perito, comprovou que essas pessoas estavam em seu próprio terreno, e não da Vale.