Ângela Carrato – Jornalista. Professora da UFMG. Membro do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)
Uma campanha curta, mas que promete ser marcada por muita baixaria e fake news. Esta é a previsão que a maioria dos políticos e especialistas fazem para as eleições municipais deste ano.
Com 10 candidatos oficializados e campanhas já nas ruas, Belo Horizonte não foge à regra e tem tudo para enfrentar uma das disputas mais acirradas de que se tem notícia.
A observação destas candidaturas aponta para a polarização entre a extrema-direita bolsonarista e o campo democrático lulista.
Não está fácil saber sequer quem lidera as pesquisas, pois os resultados diferem profundamente de um instituto para outro.
Pelo Instituto Quaest, quem está liderando a disputa é o apresentador de TV, Mauro Tramonte. Deputado estadual em segundo mandato pelo Republicanos, ele rejeita a relação com o bolsonarismo e alega que seu trabalho é “independente e focado em ações concretas para melhorar a vida das pessoas”.
Apresentador do policialesco Balanço Geral da TV Record por 16 anos, ele conta com o apoio oficioso da Igreja Universal do Reio de Deus (IRDUD), do empresário-bispo Edir Macedo, e tem os apoios declarados do governador Romeu Zema (Novo) e do ex-prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, que mesmo rompidos politicamente, decidiram marchar juntos nesta empreitada.
Tramonte tem a vantagem de ser conhecido pelo público televisivo, ao mesmo tempo em que não consegue disfarçar a atuação extremamente apagada em seus dois mandatos. Outro problema é ter se tornado “vidraça” para os demais candidatos, desde que os apoios de Zema e de Kalil à sua candidatura vieram a público.
Com a dívida pública de Minas Gerais explodindo, Zema ter dado um reajuste minguado para o funcionalismo público, 4,3%, ao passo em que reajustou o próprio salário e o do primeiro escalão em quase 300%, a popularidade do governador desabou. O mesmo pode ser dito em relação ao ex-prefeito Kalil que, de aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deu uma guinada de 180º, perdendo antigos apoiadores, sem saber se conquistará novos.
Ao que tudo indica, Zema e Kalil estão unidos em nome do pragmatismo: Zema sonha com a presidência da República e Kalil não tira o Executivo estadual da cabeça.
Antes mesmo de iniciada a campanha eleitoral, no entanto, Tramonte já estava metido em uma polêmica com o atual prefeito de Belo Horizonte e candidato à reeleição pelo PSD, Fuad Noman, ao criticar o estado das Unidades de Pronto Atendimento (UPA) da capital. Publicações feitas em suas redes sociais mostravam pacientes aguardando por atendimento e Tramonte criticando o estado das unidades.
A Justiça Eleitoral chegou a retirar os vídeos do ar após pedido do PSD, por considerá-los “propaganda antecipada”. Com o início da campanha, os vídeos já podem voltar a ser exibidos. Noman, por sua vez, promete rebater as críticas com dureza. Não se conhece nenhuma atuação do candidato do Republicanos em apoio à saúde ou mesmo à educação em Belo Horizonte. Razão pela qual tais críticas são apontadas como “puro oportunismo político”.
O próprio Noman demorou a decidir-se pela candidatura, seja por estar enfrentando tratamento de saúde, seja porque as pesquisas apontam para o desconhecimento de quem seja o atual prefeito por parte da população belo-horizontina. As críticas de Tramonte à sua gestão estão longe de serem as únicas.
No primeiro debate realizado pela TV Bandeirantes-Minas envolvendo os postulantes à PBH, Noman chegou a ser chamado de “economista do Paraguai” pelo candidato Carlos Viana, do Podemos. Viana o acusou de colocar a Prefeitura em déficit após 20 anos no azul. Depois de uma carreira longa, em que exerceu cargos de confiança em governos do PSDB e PSD, Noman tenta alçar voo político próprio, mas a empreitada não será fácil.
Como as bases do PSD na capital mineira são minguadas, ele teve que recorrer aos tucanos e aceitar o apoio do ex-governador Aécio Neves. Um mau indício para a sua campanha, uma vez que os belorizontinos já rechaçaram recentemente, por duas vezes, candidaturas tucanas. Da parte de Aécio, o apoio parece óbvio: espera remontar uma base para voltar a disputar cargos executivos. Resta saber se Noman vai convidá-lo para o palanque ou mesmo para o horário de sua propaganda eleitoral.
Depois de propagar que tinha zerado o déficit público de Minas Gerais e apresentar a construção da Cidade Administrativa como sua obra maior, Aécio amarga críticas até dos próprios correligionários. O “déficit zero” tornou-se a dívida impagável de RS 160 bilhões e a Cidade Administrativa, onde elevadores não funcionam, o ar condicionado pega fogo e há trincas na estrutura, agora é espaço para festival de assados e churrascos, a tal “Burning Fest”.
Outro nome da extrema-direita na disputa é o deputado estadual Bruno Engler (PL), um bolsonarista assumido, que se pauta por ideias conservadoras e retrogradas. Engler trava uma disputa direta com Tramonte, com quem vem alternando na liderança, dependendo do instituto de opinião pública.
Na mais recente pesquisa divulgada, a da AtlasIntel, por exemplo, Engler aparece à frente, com 29,4% das intenções de voto. Ele é seguido pelo deputado federal Rogério Correia (PT), apoiado pelo presidente Lula, com 16,6%. Tramonte está em terceiro lugar, com 9,4%, tecnicamente empatado com Noman, com 9,3%.
Também empatada tecnicamente em terceiro lugar está a deputado federal Duda Salabert (PDT), com 9%. Em seguida aparecem o vereador Gabriel Azevedo (MDB), com 7,8% e o senador Carlos Viana (Podemos), com 4,7%.
O crescimento da candidatura do deputado Rogério Correia é explicado pelo fato dele ter conseguido viabilizar uma frente, com a presença da deputada estadual Bela Gonçalves, do PSOL, como sua vice, e tendo o apoio do PC do B, da Rede e do PV. Houve bastante esforço de Correia para atrair também a candidata Salabert, mas sem sucesso.
Como o PDT não tem estrutura na capital mineira, a avaliação que se faz é de que a candidata sozinha não conseguirá ampliar significativamente seus apoios. Fato que se acontecer será ruim para a candidata, mas pode ter implicações igualmente negativas para o setor progressista nesta disputa.
O deputado Rogério Correia foi considerado quem se saiu melhor no debate da TV Bandeirantes, pelas propostas e soluções para enfrentar os desafios de Belo Horizonte. Some-se a isso que ele conta com o passado positivo de administrações petistas na capital nos anos 1990, a começar pela gestão de Patrus Ananias, com o estabelecimento do orçamento participativo, de restaurantes populares e de ênfase em saúde, educação e cultura.
Correia saiu-se muito bem, igualmente, na sabatina a que foi submetido pelo Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé. A sabatina está disponível no Youtube. Nela o candidato aborda temas políticos e econômicos da conjuntura e apresenta propostas inovadoras como a voltada para geração de renda para idosos entre 60 e 65 anos.
Correia tem o apoio da maioria dos movimentos sociais de Belo Horizonte e de artistas e intelectuais.
Como os institutos de pesquisa, pelo menos até agora, estão apresentando resultados muito díspares, os eleitores vão ter que estar muito atentos para o histórico de cada candidato, suas propostas e a coerências entre o que dizem e fazem.
É preciso estar atento também para oportunismos de quem quer desviar o assunto e, ao invés de discutir soluções e propostas para a capital mineira, entrar pelo campo do moralismo ou por temas que extrapolam a competência de um prefeito ou vereador.
Como a campanha eleitoral será rápida, com a propaganda no rádio e na TV começando em duas semanas, vai levar vantagem quem conseguir se organizar melhor em eventos nas ruas, nas redes e apresentar apoiadores confiáveis aos olhos da população.
Engler aposta em Bolsonaro para chegar ao segundo turno.
Tramonte acredita na eficácia do apoio de Zema e de Kalil e, claro, do templo de Edir Macedo.
Noman joga suas fichas em Aécio.
Já Correia acredita nas próprias propostas, na gestão que faz o presidente Lula, e nas ótimas lembranças que os belorizontinos têm dos tempos em que o PT governou a cidade.
A pancadaria será inevitável. Há como ser diferente numa fita com tais atores?