A União deverá indenizar Maria Thereza Goulart, viúva do ex-presidente da República João Goulart, o Jango, no valor de R$ 79 mil por danos morais, decidiu a Justiça Federal. Cabe recurso da decisão ao TRF4 (Tribunal Regional Federal da Quarta Região).
O motivo da decisão do juiz Bruno Risch Fagundes de Oliveira foi pela perseguição política e o exílio sofridos por ela e seus filhos durante o regime militar. A sentença foi publicada em 24 de dezembro de 2023.
Maria ingressou com a ação justificando que Jango tinha uma carreira bem-sucedida no ramo agropecuário e também na política, tendo sido deputado federal, ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, vice-presidente eleito nos governos de Juscelino Kubitschek e de Jânio Quadros, assumindo a presidência em 1961 e sendo deposto em 1964.
Em 1964, ela e seus filhos foram retirados às pressas da Granja do Torto e colocados em um avião da Força Aérea para Porto Alegre, com bagagem mínima, deixando a maioria de seus pertences para trás. Segundo ela, seu patrimônio, que incluía joias e roupas de marca, não foi mais rastreado, tendo sido saqueado logo após sua saída de Brasília. O rebanho de gado de suas fazendas também foi roubado, além de ativos pessoais.
A viúva ainda relatou que eles foram obrigados a sair do Brasil, indo buscar exílio no Uruguai, onde viveram até 1973, quando um golpe de Estado também foi instaurado. A família então foi para a Argentina, mas, em 1975, iniciaram as atividades da Operação Condor e, no ano seguinte, um novo golpe de Estado instaurou-se naquele país.
Ela afirmou que as tensões aumentaram com a descoberta de um plano para sequestrar os filhos, assim eles foram enviados para Londres, onde seu neto nasceu. Maria destacou o período de “dificuldades, incertezas e saudades”, que se agravou com o falecimento de Jango.
Em sua defesa, a União ressaltou que a viúva não sofreu prisões, torturas ou agressões pelo Estado Brasileiro e que ela já afirmou, em outras ocasiões, que a vida no exterior era confortável até que se instalaram regimes ditatoriais naqueles países. Segundo a União, ela teria admitido em entrevista que, mesmo no exílio, não sofreu “grandes privações econômicas”.
A AGU (Advocacia-Geral da União) disse a reportagem que “foi intimada da referida sentença e no momento avalia as medidas cabíveis”.
A decisão
O juiz federal substituto Bruno Risch Fagundes de Oliveira pontuou que o dano moral decorrente do exílio por motivação exclusivamente política envolve injusta privação dos direitos da cidadania. Ele considerou que a suspensão dos direitos políticos do então presidente destituído “transcendeu os limites de sua própria esfera de direitos, impactando diretamente sua esposa e mãe de seus dois filhos”.
“O grupo familiar do ex-presidente, como um todo, teve de suportar os danos decorrentes de tal ato de exceção, que se iniciaram com a fuga do território nacional e tiveram desdobramentos ao longo de mais de uma década e meia de perseguição política, assim reconhecida no processo administrativo que tramitou na Comissão de Anistia do Ministério da Justiça”, disse Bruno Risch Fagundes de Oliveira, juiz federal substituto.
Ele também destacou que a documentação pública do Arquivo Nacional mostra que, mesmo fora dos limites territoriais do Brasil, o Estado manteve “controle e vigilância ostensiva sobre o ex-presidente João Goulart”, por meio de cooperação com outros países.
No contexto fático ocorrido e historicamente reconhecido, tenho que o ilegítimo monitoramento do ex-presidente durante todo o exílio, por motivação exclusivamente política, inexoravelmente se estendeu à sua esposa, pois indissociável a vigilância da vida privada de um e de outro.
Bruno Risch Fagundes de Oliveira, que entendeu estar caracterizado o dano aos direitos da personalidade de Maria.