O ex-ajudante de ordens Mauro Cid reforçou, em depoimento ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que o ex-presidente Jair Bolsonaro tinha pleno conhecimento da chamada minuta golpista e chegou a sugerir alterações no documento. A declaração ocorreu em audiência realizada na última quinta-feira, onde Moraes buscou esclarecer se Bolsonaro estava ciente do teor integral da minuta, informação confirmada por Cid.
A disposição de Cid em colaborar foi determinante para que o acordo de delação premiada firmado com a Polícia Federal (PF) permanecesse válido. Após três horas de depoimento, o gabinete de Moraes confirmou que as omissões e contradições anteriormente apontadas pela PF foram devidamente esclarecidas, e as informações fornecidas por Cid continuam sob investigação das autoridades competentes.
Após o indiciamento, Bolsonaro criticou Moraes em declarações ao portal Metrópoles e defendeu que “não é crime discutir a Constituição”, em referência às conversas sobre a possibilidade de instaurar um estado de sítio no país. Ele reconheceu que houve debates sobre o tema, mas alegou que tais discussões não configurariam ilegalidade.
A investigação da PF revelou que reuniões envolvendo ministros, oficiais das Forças Armadas e assessores de Bolsonaro discutiram a possibilidade de um golpe de Estado. Segundo a PF, o plano não foi adiante devido à falta de apoio dos então comandantes do Exército e da Aeronáutica. O general Marco Antônio Freire Gomes e o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior confirmaram, em depoimentos, que Bolsonaro apresentou um documento que mencionava hipóteses de instaurar estado de defesa ou de sítio, além de iniciar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Em uma das reuniões, ocorrida no Palácio da Alvorada no dia 7 de dezembro de 2022 — após a derrota de Bolsonaro para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva —, o ex-presidente apresentou uma versão do documento com propostas de criar uma comissão para avaliar a regularidade do processo eleitoral. O general Freire Gomes relatou que essa versão previa a decretação do estado de defesa e reforçava suspeitas infundadas sobre a lisura das eleições.
Outra revelação do depoimento de Cid envolve o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022. Segundo o relatório da PF, uma reunião realizada em 12 de novembro de 2022, no apartamento de Braga Netto, teria servido para discutir detalhes de um golpe de Estado. Cid confirmou o encontro e detalhou os temas abordados, corroborando as investigações que implicam Braga Netto diretamente nos planos.
Após essa reunião, integrantes das forças especiais, conhecidos como “kids pretos”, iniciaram um monitoramento de Moraes, que, segundo as apurações, fazia parte de um plano mais amplo para assassinar autoridades como o ministro do STF, Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin. O inquérito da PF também aponta Braga Netto como um dos indiciados por participação nesse esquema.
Em mensagens trocadas após o encontro, Marcelo Câmara, então assessor especial da Presidência, detalhou para Cid a rota que Moraes utilizaria durante a cerimônia de diplomação de Lula, em 12 de dezembro de 2022. A comunicação evidencia o grau de planejamento do grupo, embora Cid tenha negado envolvimento direto no plano para matar as autoridades.
O depoimento de Cid reforça as acusações contra Bolsonaro e Braga Netto, figuras centrais no suposto esquema golpista. A confirmação de reuniões destinadas a elaborar estratégias para subverter o resultado eleitoral agrava a situação dos envolvidos, especialmente diante das declarações de Cid que apontam Bolsonaro como ciente e participante ativo das articulações.
Braga Netto, que ocupou posições estratégicas no governo Bolsonaro, como os ministérios da Casa Civil e da Defesa, agora enfrenta acusações que podem comprometer sua carreira militar e política. O desdobramento das investigações pela PF será crucial para determinar o destino legal dos implicados.
Foto: Alan Santos / PR