Por muito tempo, o Brasil foi considerado um dos países mais ricos em recursos hídricos. No entanto, um estudo publicado na revista Nature Communications revela que mais da metade dos rios do país está sob risco, perdendo água para o subsolo, o que compromete sua vazão e pode afetar tanto o abastecimento humano quanto os ecossistemas aquáticos. A pesquisa foi conduzida por cientistas da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com pesquisadores dos Estados Unidos, e analisou dados de 17.972 poços em todo o território nacional. Os resultados mostraram que 55,4% desses poços apresentam níveis de água subterrânea abaixo da superfície dos rios mais próximos, indicando que a água dos rios está se infiltrando no solo e reduzindo sua vazão.

A infiltração é um processo natural que regula o ciclo hidrológico e mantém a disponibilidade hídrica. No entanto, quando a retirada de água subterrânea é excessiva, o lençol freático se aprofunda, causando a chamada percolação reversa. Esse fenômeno pode reduzir a vazão dos rios e prejudicar os ecossistemas aquáticos. Fatores como desmatamento e compactação do solo agravam o problema. A retirada da vegetação compromete a absorção da água das chuvas, aumentando o escoamento superficial e reduzindo a recarga dos lençóis freáticos. Além disso, solos compactados por atividades agrícolas ou urbanização dificultam a infiltração, piorando a situação.

A infiltração também impacta a qualidade da água subterrânea. Em regiões com contaminação por agrotóxicos e esgoto, essas substâncias podem atingir o lençol freático, comprometendo a segurança hídrica. Dessa forma, a gestão dos recursos hídricos deve considerar tanto a quantidade quanto a qualidade da água disponível. O estudo revelou que 69% dos rios que perdem vazão estão em áreas áridas ou com intensa atividade agrícola, onde a retirada de água subterrânea para irrigação é mais frequente. A bacia do rio São Francisco é uma das regiões mais afetadas: 61% dos rios analisados na área correm risco de perda de vazão, chegando a 74% no rio Verde Grande, um de seus afluentes.

Outro ponto crítico identificado é a região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), onde a expansão da agricultura irrigada intensificou o risco de esgotamento dos rios. A redução da vazão nesses rios pode gerar impactos ambientais e sociais severos, como menor disponibilidade de água para consumo humano, alterações nos ecossistemas aquáticos, prejudicando espécies dependentes de vazões constantes, afundamento do solo, gerando riscos para infraestruturas urbanas e rurais, além do colapso do solo em áreas com retirada excessiva de água subterrânea.

Para evitar o agravamento desse cenário, especialistas sugerem integrar a gestão das águas superficiais e subterrâneas, monitorando os níveis de poços e rios para garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos. Além disso, o uso eficiente da água na agricultura, por meio de sistemas de irrigação que minimizem o desperdício, e o investimento em tecnologia e pesquisa são essenciais. Sem ações concretas, os rios brasileiros continuarão perdendo vazão, comprometendo o abastecimento de água e a biodiversidade do país. O desafio é grande, mas medidas adequadas podem mitigar os impactos e garantir a segurança hídrica para as próximas gerações.

Foto: Licia Rubinstein/Agência IBGE Notícias


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