O Ministério das Relações Exteriores do Brasil criticou nesta sexta-feira o tom “ofensivo” adotado pela Venezuela nas recentes declarações contra o país e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, marcando a primeira resposta oficial brasileira diante da escalada de tensões. Em comunicado, o Itamaraty expressou surpresa com as manifestações venezuelanas, que classificou como ataques pessoais e retóricos em lugar do diálogo político e diplomático.
“O governo brasileiro constata com surpresa o tom ofensivo adotado por manifestações de autoridades venezuelanas em relação ao Brasil e aos seus símbolos nacionais. A opção por ataques pessoais e escaladas retóricas, em substituição aos canais políticos e diplomáticos, não corresponde à forma respeitosa com que o governo brasileiro trata a Venezuela e o seu povo”, declarou o comunicado do Itamaraty.
A resposta do Brasil foi motivada por uma publicação feita pela Polícia Nacional da Venezuela na quinta-feira, na qual uma imagem com a bandeira brasileira e a silhueta de um homem semelhante a Lula, porém borrada, foi compartilhada com a legenda: “Quem se mete com a Venezuela se dá mal”. Para funcionários do governo brasileiro, as manifestações da administração de Nicolás Maduro vêm perdendo o “sentido da realidade”. Embora o governo Lula tenha evitado reagir anteriormente, o uso de um símbolo nacional como a bandeira na publicação venezuelana levou o Planalto e o Itamaraty a responder oficialmente.
Fontes do governo afirmam que, até certo ponto, críticas a autoridades ou instituições podem ser ignoradas, mas que atacar a bandeira brasileira representa uma ofensa mais grave. “Uma coisa é criticar, ainda que sem fundamento, autoridades ou até mesmo instituições de governo“, explicou uma das fontes. “Mas o ataque a um símbolo nacional elevou a crise de patamar e levou o Brasil a decidir abandonar o silêncio.”
A tensão entre Brasil e Venezuela aumentou consideravelmente desde o início de 2023, quando Lula assumiu a presidência. No primeiro ano de mandato, o governo brasileiro buscou reconstruir relações com a Venezuela, mas as tensões escalaram após declarações de Maduro sobre possíveis ações militares para recuperar o território do Essequibo, em disputa com a Guiana. O desgaste se intensificou após a eleição presidencial venezuelana de 28 de julho, cujo resultado o Brasil se recusou a reconhecer, exigindo a divulgação de atas eleitorais que comprovassem a vitória de Maduro.
A relação entre os países sofreu novo impacto durante a cúpula do Brics na Rússia, quando o Brasil bloqueou a entrada da Venezuela no grupo de países emergentes. Desde então, o governo Maduro aumentou as críticas ao Itamaraty e a membros do governo brasileiro. Em um dos episódios mais recentes, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela publicou uma nota na quarta-feira acusando Celso Amorim, assessor de Lula, de ser um “mensageiro do imperialismo norte-americano” que emite “juízos de valor” sobre assuntos que seriam de responsabilidade exclusiva da Venezuela e de suas instituições.
A crise diplomática atual representa o ponto mais alto das tensões entre Brasil e Venezuela desde o início do novo mandato de Lula, refletindo o desgaste nas relações após os esforços iniciais do governo brasileiro para retomar o diálogo com o país vizinho.
Leia a nota na íntegra
“Manifestações de autoridades venezuelanas sobre o Brasil
O governo brasileiro constata com surpresa o tom ofensivo adotado por manifestações de autoridades venezuelanas em relação ao Brasil e aos seus símbolos nacionais.
A opção por ataques pessoais e escaladas retóricas, em substituição aos canais políticos e diplomáticos, não corresponde à forma respeitosa com que o governo brasileiro trata a Venezuela e o seu povo.
O Brasil sempre teve muito apreço ao princípio da não-intervenção e respeita plenamente a soberania de cada país e em especial a de seus vizinhos.
O interesse do governo brasileiro sobre o processo eleitoral venezuelano decorre, entre outros fatores, da condição de testemunha dos Acordos de Barbados, para o qual foi convidado, assim como para o acompanhamento do pleito de 28 de julho.
O governo brasileiro segue convicto de que parcerias devem ser baseadas no diálogo franco, no respeito às diferenças e no entendimento mútuo.”