O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a suspensão imediata da audiência pública agendada para esta terça-feira, dia vinte e nove de abril de dois mil e vinte e cinco, no município de Araçuaí, localizado no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. O evento tinha como finalidade discutir o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do Projeto Anitta, voltado à exploração de lítio pela empresa Atlas Lithium.
Segundo o MPF, a audiência pública não pode substituir a consulta prévia, livre e informada, obrigatória quando há povos e comunidades tradicionais potencialmente afetados, direta ou indiretamente, como determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No caso de Araçuaí, destaca-se a presença de comunidades quilombolas como Giral e Malhada Preta, cuja autodeclaração como povos tradicionais deve ser respeitada.
De acordo com o procurador da República Helder Magno da Silva, responsável pela recomendação, a audiência proposta não atende aos preceitos constitucionais nem aos critérios da Convenção nº 169. Ele afirma que o processo em curso ignora a necessidade de respeitar a organização social, os costumes, as línguas e tradições das comunidades impactadas, além de não configurar uma consulta adequada e de boa-fé.
O MPF também recomendou que a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (SEMAD) e a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) anulem eventuais licenças ambientais concedidas antes da realização da consulta prévia obrigatória. Segundo o órgão, é fundamental garantir a participação ampla e efetiva das comunidades em todas as etapas do processo de licenciamento.
A recomendação do MPF está em conformidade com o entendimento da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão (6CCR), especializada em direitos de povos e comunidades tradicionais, que estabelece, por meio do Enunciado nº 47, que a autodeclaração de comunidades tradicionais é legítima e possui efeitos jurídicos, independentemente do reconhecimento formal do Estado.
O parecer técnico nº 1539/2024, elaborado pela Assessoria Nacional de Perícia em Antropologia da Procuradoria-Geral da República, identificou duzentas e quarenta e oito comunidades tradicionais potencialmente afetadas por atividades de mineração de lítio em dezenove municípios da região. No caso específico de Araçuaí, pelo menos duas comunidades têm seus territórios diretamente sobrepostos por três processos minerários, enquanto outras nove estão localizadas a menos de cinco quilômetros de áreas com requerimentos de lavra, evidenciando a gravidade da situação.
O MPF concedeu prazo de cinco dias para que os órgãos ambientais respondam à recomendação e informem as providências adotadas.
Foto: Isis Medeiros