Em 2024, as emissões absolutas de gases de efeito estufa (GEE) da Petrobras totalizaram 47 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂), conforme revela o Caderno de Mudança do Clima, divulgado nesta sexta-feira (23). O número é semelhante ao registrado nos dois anos anteriores — 48 milhões em 2022 e 46 milhões em 2023 — e representa uma redução de 40% em relação a 2015, superando a meta de recuo de 30% prevista para 2030. A estatal agora trabalha com a ambição de manter o índice de 40% até o final da década.
O documento anual da companhia detalha a pegada de carbono da Petrobras, enumerando ações implementadas em suas operações de exploração, produção e comercialização de combustíveis. O relatório também explicita metas e estratégias para alcançar fontes energéticas mais sustentáveis. Entre os principais objetivos da estatal está a neutralidade nas emissões operacionais até 2050 — a chamada meta de “net zero”.
Mauricio Tolmasquim, diretor de Transição Energética e Sustentabilidade desde 2023 e responsável por coordenar o documento, deve deixar o cargo em breve para assumir uma vaga no conselho da Eletrobras. “Este caderno mostra e reforça o compromisso que a Petrobras tem com a transparência”, declarou Tolmasquim.
Segundo ele, o maior desafio é equilibrar a necessidade de reduzir a pegada de carbono enquanto a empresa aumenta sua produção energética. “A energia do petróleo continuará sendo demandada globalmente. O Brasil precisa realizar uma transição energética justa, atendendo ao crescimento da demanda por energia sem comprometer a luta contra as mudanças climáticas.”
Até 2030, a empresa planeja colocar em operação dez novas unidades FPSO — navios-plataforma que produzem, armazenam e transferem petróleo e gás — sem aumentar o volume de emissões. “Vamos aumentar a produção, mas com medidas que tornem os processos mais eficientes, substituindo fontes energéticas e evitando que as emissões cresçam”, afirmou.
A pegada de carbono da Petrobras representa hoje cerca de 3% das emissões nacionais, considerando tanto as emissões diretas quanto as indiretas. Se necessário, a empresa poderá recorrer ao mercado de créditos de carbono para cumprir suas metas de 2030 e 2050. Em março, a Petrobras anunciou a compra de R$ 450 milhões em créditos de carbono na Amazônia.
A estatal também obteve em 2024 seu melhor desempenho histórico na emissão de metano, outro potente gás de efeito estufa. A taxa foi de 0,20 toneladas de metano para cada mil toneladas de hidrocarbonetos produzidos (tCH4/mil tHC), o que representa queda de 0,02 tCH4/mil tHC em relação a 2023 e de 70% ante 2015. Esses avanços são atribuídos à redução de queimas em flares — as chamas visíveis nas torres de plataformas — e a ações de eficiência nos segmentos operacionais.
Outro destaque do relatório é a reinjeção de CO₂ em campos do pré-sal por meio da tecnologia CCUS (Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono), que alcançou 14,2 milhões de toneladas injetadas — mais de 25% do total global registrado. “Você separa o CO₂ do gás natural extraído e o reinjeta no reservatório, evitando que ele seja lançado na atmosfera”, explicou Tolmasquim. A meta é atingir 80 milhões de toneladas de CO₂ reinjetadas até 2030.
Hoje, a Petrobras emite, em média, 15 kg de CO₂ para cada barril de petróleo produzido, abaixo da média mundial de 17 kg. Nos campos do pré-sal, essa emissão chega a apenas 10 kg por barril. Questionado sobre se o mesmo padrão poderá ser alcançado em novas fronteiras exploratórias como a Margem Equatorial, no Norte, e a Bacia de Pelotas, no Sul, Tolmasquim disse que isso dependerá da viabilidade das jazidas. “Ainda estamos em fase de pesquisa, mas estamos otimistas”, afirmou.
Viviana Coelho, gerente executiva de Mudança Climática e Descarbonização, destacou que cada nova geração de projetos tem conseguido incorporar tecnologias mais eficientes. “A última geração emite 20% menos que a anterior, de cinco anos atrás. Não sabemos a qualidade das novas jazidas, mas usaremos o que houver de melhor para reduzir emissões”, garantiu.
Em 2024, a Petrobras direcionou cerca de US$ 600 milhões (aproximadamente R$ 3,42 bilhões) a projetos de baixo carbono. O plano de negócios 2025-2029 prevê investimento total de US$ 16,3 bilhões (mais de R$ 90 bilhões) em iniciativas de transição energética, descarbonização de operações e pesquisa e inovação. O montante representa aumento de 42% em relação ao plano anterior.
Dentro desse montante, a companhia criou um fundo exclusivo para descarbonização, com recursos de US$ 1,3 bilhão (mais de R$ 7 bilhões), destinado a viabilizar projetos que, embora menos rentáveis, oferecem maior redução de emissões. “Se uma tecnologia mais limpa for mais cara, esse fundo permite que ela seja adotada”, explicou Tolmasquim.
Atualmente, 34 projetos estão vinculados ao fundo, com alocação de US$ 430 milhões e previsão de reduzir 1,5 milhão de toneladas de CO₂ por ano — o equivalente às emissões de uma refinaria ou três plataformas. Todos os projetos passam por análise de resiliência, que avalia sua rentabilidade mesmo em cenários adversos, como queda no preço do petróleo ou alta nos créditos de carbono. “Concluímos que 98% dos nossos investimentos são rentáveis mesmo nesses cenários críticos”, afirmou Tolmasquim.
Recentemente, a Petrobras anunciou redução nos preços do óleo diesel, refletindo a queda do barril de petróleo no mercado internacional. Durante a apresentação do balanço trimestral, a presidente da companhia, Magda Chambriard, afirmou que cortes de gastos serão necessários para se ajustar ao novo cenário de preços.
Tolmasquim, porém, assegurou que os investimentos em descarbonização estão garantidos. “A publicação do caderno do clima é um compromisso público. A Petrobras fará tudo o que for necessário para cumprir as metas”, afirmou, afastando qualquer risco de recuo nesse planejamento. A data exata da sua saída da diretoria ainda não foi definida, mas ele garantiu que as ações em curso não dependem de uma única liderança. “Todas as iniciativas estão institucionalizadas e seguirão adiante.”
O Caderno de Mudança do Clima também ressalta o investimento em fontes de energia mais sustentáveis, como etanol, biodiesel, SAF (combustível sustentável para aviação) e as energias solar e eólica. Essas alternativas fazem parte da estratégia da Petrobras para assumir protagonismo na transição energética.
Segundo Tolmasquim, o etanol está entre as apostas mais imediatas da companhia. “É uma tecnologia já conhecida, tem mercado, preço e escala. É uma commodity consolidada”, destacou. No Brasil, a gasolina possui atualmente 27% de etanol em sua composição, proporção que será ampliada para 30%. O biodiesel também foi citado como exemplo de combustível promissor.
O diretor mencionou ainda o hidrogênio verde como alternativa futura, apesar de seu custo elevado e da ausência de regulação adequada. “É extremamente promissor, mas ainda depende de avanços estruturais”, observou.
A Petrobras também confirmou que está em estágio avançado para voltar ao mercado de etanol, por meio de parcerias com empresas do setor. “Temos projetos em análise interna, já avançando nos nossos portões decisórios”, afirmou Tolmasquim.
A estatal se afastou do setor por decisão do plano de negócios 2017-2021, quando se desfez de parcerias com usinas. Agora, no contexto da transição energética e com a demanda por combustíveis mais sustentáveis crescendo, a empresa se prepara para retomar posição nesse mercado estratégico.
O compromisso da Petrobras com metas climáticas, mesmo diante de um cenário desafiador para o setor de petróleo e gás, é central na comunicação institucional da companhia. A publicação do Caderno de Mudança do Clima em 2024 reafirma esse posicionamento e reforça a intenção de liderar uma transição energética alinhada aos objetivos globais de sustentabilidade.
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