Em uma decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou na última quarta-feira, 25 de setembro, um acordo que coloca fim a um dos conflitos fundiários mais emblemáticos do Brasil, relacionado à demarcação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, localizada no estado do Mato Grosso do Sul. Após anos de disputas, foi estabelecido um consenso entre todas as partes envolvidas, resultando em uma solução pacífica para o impasse que perdurava desde 2005.
O acordo prevê a desocupação da área por parte dos fazendeiros em um prazo de 15 dias, com indenizações vultuosas sendo asseguradas pela União e pelo governo do Mato Grosso do Sul. No total, será pago um montante de R$ 27,8 milhões como compensação pelas benfeitorias realizadas na terra, além de R$ 101 milhões pela chamada “terra nua”, que corresponde ao valor das propriedades sem qualquer melhoria. Esse valor será viabilizado por meio de um crédito suplementar, demonstrando o empenho do governo federal em cumprir o acordo. Paralelamente, o governo do Mato Grosso do Sul, em um esforço para cooperar com a resolução do conflito, se comprometeu a depositar R$ 16 milhões em juízo, quantia destinada diretamente aos proprietários das terras.
A conciliação foi fruto de intensas negociações e contou com a participação de diversas entidades e representantes. Estiveram presentes na audiência de conciliação liderada pelo ministro do STF, Gilmar Mendes, os proprietários das terras, líderes indígenas, membros da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), representantes da Advocacia-Geral da União (AGU), do Ministério dos Povos Indígenas, além de integrantes do governo estadual do Mato Grosso do Sul. Esse diálogo envolveu não apenas os aspectos econômicos, mas também os direitos territoriais dos povos indígenas e a reparação por eventuais danos causados ao longo de anos de conflito.
Com a formalização do acordo, todos os processos judiciais relacionados à demarcação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu que ainda tramitavam na Justiça serão arquivados. Isso significa que a decisão tomada no âmbito da conciliação terá efeito imediato e extinguirá qualquer discussão legal ainda existente sobre o caso.
A Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, com uma área de mais de 9 mil hectares, foi inicialmente demarcada em 2005, durante um processo que visava garantir os direitos dos povos indígenas Guarani Kaiowá, que habitam a região há séculos. Contudo, essa demarcação foi rapidamente contestada por proprietários rurais que detinham títulos de propriedade da área, levando o caso ao STF. Desde então, o processo enfrentava uma longa espera por julgamento, enquanto as tensões entre indígenas e fazendeiros aumentavam.
Na semana anterior à oficialização do acordo, o conflito ganhou repercussão nacional após a morte de um indígena da etnia Guarani Kaiowá durante uma ação da Polícia Militar na Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, situada no município de Antônio João, Mato Grosso do Sul. Os indígenas haviam retomado a posse da terra no dia 12 de setembro, o que culminou em uma operação policial na região. Esse trágico incidente evidenciou a gravidade da situação e a necessidade urgente de uma solução pacífica e definitiva para o conflito.
A formalização desse acordo representa uma vitória importante para os direitos dos povos indígenas no Brasil, garantindo a posse definitiva de uma terra tradicionalmente ocupada pelos Guarani Kaiowá. Além disso, demonstra o empenho do STF e das instituições envolvidas em promover o diálogo e a conciliação como meios eficazes para resolver disputas complexas, especialmente em temas relacionados à demarcação de terras indígenas, que são historicamente marcados por violência, exclusão e disputas prolongadas.
O desfecho positivo desse conflito serve como um exemplo de que, com a devida mediação e respeito aos direitos constitucionais, é possível encontrar soluções justas que beneficiem tanto os povos indígenas quanto os demais atores envolvidos, preservando a integridade e a dignidade de todos. O acordo firmado pelo STF pavimenta o caminho para futuras negociações envolvendo terras indígenas no Brasil, trazendo à tona a necessidade de um olhar mais atento e uma postura conciliatória para evitar a perpetuação de conflitos que afetam diretamente a vida e a cultura dos povos originários do país.