O “Uol” publicou neste domingo (24/11) uma matéria do jornalista Théo Mariano que detalha como Goiânia se tornou epicentro das articulações golpistas que marcaram a política brasileira. Tradicionalmente reconhecida por seu crescimento econômico e clima ameno, a cidade agora figura como ponto central no planejamento de ações antidemocráticas conduzidas por militares, especialmente os “kids pretos”, integrantes das forças especiais formados no Comando de Operações Especiais (COpEsp).
A conexão entre Goiânia e as tentativas de golpe ganhou notoriedade após a Polícia Federal (PF) deflagrar, em 19 de novembro de 2024, uma operação que prendeu quatro militares e um policial federal. Os presos estão ligados ao plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Os “kids pretos”, militares da elite do Exército brasileiro, recebem treinamento avançado no COpEsp, sediado em Goiânia. Sua formação inclui habilidades de guerrilha urbana, sabotagem e inteligência estratégica, que, segundo a PF, foram utilizadas no planejamento do golpe.
O jornal “O Popular”, de Goiânia, revelou que a cidade foi mencionada 39 vezes nos relatórios da PF sobre a conspiração de 2022. A investigação aponta que militares locais, com base no COpEsp, participaram ativamente das articulações, incluindo o evento chamado “Copa 2022”, planejado para 15 de dezembro de 2022.
Entre os detidos na operação da PF estão o tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo e o tenente-coronel Rafael “Joe” Martins de Oliveira, ambos com ligação direta a Goiânia. Azevedo teria liderado a tentativa de prisão de Moraes, enquanto Joe foi responsável por adquirir equipamentos e telefones “frios” para dificultar a identificação dos envolvidos.
Outro militar, o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, também esteve em Goiânia para reuniões estratégicas. Em novembro de 2022, ele chegou de avião e utilizou um carro alugado por Joe para se deslocar e iniciar o monitoramento de Moraes.
Após a derrota de Jair Bolsonaro em outubro de 2022, Goiânia se tornou palco de protestos golpistas. Manifestantes bloquearam vias e realizaram atos em frente ao COpEsp por quase 60 dias, exigindo a prisão de Lula e a destituição de ministros do STF.
A relação de Goiânia com articulações golpistas remonta ao golpe militar de 1964. O COpEsp, criado em 1957, desempenhou papel importante na formação de agentes que integrariam o Serviço Nacional de Informações (SNI), órgão de espionagem da ditadura militar.
Jair Bolsonaro manteve uma relação próxima com Goiânia durante sua presidência, realizando visitas frequentes ao COpEsp e fortalecendo laços com a elite militar. Em 2018, como revelado pela revista *Piauí*, o general Luiz Eduardo Ramos, aliado de Bolsonaro, afirmou que o então candidato estaria “nas mãos” dos militares se fosse eleito, antecipando a influência das Forças Armadas em seu governo.
Bolsonaro também foi introduzido ao general da reserva Mário Fernandes, apontado como líder do planejamento golpista, durante uma visita oficial ao COpEsp.
Na vila militar localizada no Setor Marista, um dos bairros mais nobres de Goiânia, o clima é de silêncio após a operação da PF. Os moradores, majoritariamente oficiais de alta patente, evitam comentar o caso.
Enquanto isso, as investigações continuam a expor os bastidores das articulações golpistas, colocando Goiânia como peça-chave em uma crise que desafia a democracia brasileira.
A matéria de Théo Mariano revela como Goiânia, berço dos “kids pretos” e sede de articulações golpistas, se tornou protagonista de uma das maiores crises políticas do país. A cidade, que já desempenhou papel estratégico no golpe de 1964, volta aos holofotes como símbolo de tensões entre as Forças Armadas e a democracia brasileira.
Foto: Divulgação Exército