Na mesma semana em que o julgamento dos assassinos de Marielle Franco e Anderson Gomes culminou em condenação por júri popular no Rio de Janeiro, o presidente Lula, junto a líderes do Judiciário e do Legislativo, reuniu governadores em Brasília para discutir um pacote essencial de medidas contra a violência. O tema é urgente para um Brasil em crise de segurança pública, que exige colaboração entre todos os entes federativos. No entanto, poucos dias após as eleições municipais, a polarização voltou com força total, e governadores de oposição a Lula evitaram participar de uma discussão que vai além da política partidária.

A ausência de alguns governadores conservadores destacou a divisão: Ratinho Júnior (PSD), do Paraná, e Jorginho Melo (PL), de Santa Catarina, não compareceram nem enviaram representantes. Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, e Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul, enviaram apenas representantes de cargos inferiores, sinalizando desinteresse pelo encontro.

Mesmo Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, embora presente, trouxe mais tensão do que cooperação. Pré-candidato à presidência em 2026, Caiado chegou com um discurso incisivo, sem ter analisado o pacote, acusando o governo federal de buscar centralizar a segurança pública e “invadir” a autonomia dos estados.

Durante a reunião, Caiado defendeu que em Goiás não há problemas de segurança, minimizando a gravidade da crise. Lula respondeu com ironia, afirmando: “Eu tive a oportunidade de conhecer hoje o único Estado que não tem problema de segurança, que é Goiás. Em vez de eu ter chamado a reunião, o Caiado é que devia ter chamado.” A postura de Caiado gerou desconforto entre os demais participantes, mas reforçou sua postura pública de oposição.

Por outro lado, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo, foi a exceção entre os conservadores. Tarcísio, que também é visto como possível candidato em 2026, participou do debate de forma construtiva, demonstrando disposição para colaborar, ouvir e propor ajustes no pacote de segurança. A saída, Tarcísio comentou: “A PEC não resolve tudo, mas abre espaço para diálogo e ajustes.” Ele também apontou que a proposta precisa de melhorias para garantir a autonomia estadual, mas destacou a necessidade de iniciativas federativas conjuntas contra o crime organizado. Sua postura pragmática destacou-se da acidez de outros líderes da direita, sinalizando uma estratégia moderada para seu futuro político.

O pacote proposto pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, com apoio do ex-ministro Flávio Dino, inclui ações para unificar o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), inspirando-se no modelo do SUS. Entre as medidas estão a ampliação da atuação da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), a criação de um banco nacional de dados e a padronização de documentos e procedimentos, especialmente para combater o crime organizado que atua em várias regiões. Essa cooperação é vista como vital, dado que as mesmas facções criminosas operam em diferentes estados, exigindo uma resposta integrada e eficaz.

Apesar da urgência do tema e da crescente pressão para coordenação federal na segurança pública, o avanço das discussões enfrenta resistência de alguns estados e aparente desinteresse da Casa Civil. A segurança é uma responsabilidade estadual, mas o crescente impacto do crime organizado no país demanda instrumentos de cooperação federal.

Ao ignorarem ou minimizarem o debate, alguns governadores da direita parecem mais preocupados em manter distância de Lula e da agenda federal do que em enfrentar uma crise que afeta seus próprios estados. A participação ativa de Tarcísio, ao contrário, sugere um caminho que concilia interesses locais com uma visão de segurança pública nacional. Em contraste, outros líderes conservadores parecem focados em estratégias políticas visando 2026, enquanto o Brasil aguarda ações concretas para enfrentar uma das questões mais críticas de sua agenda interna.

Foto: Ricardo Stuckert / PR

 


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