Em Belo Horizonte, o aumento de casos de Covid-19 tem afetado o serviço público de duas maneiras: aumento no número de atendimentos e também crescimento do índice de servidores afastados do trabalho devido à enfermidade.

De acordo com dados da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), em maio, quase 87 trabalhadores foram afastados das funções todos os dias por motivo de adoecimento.

Em todo o mês, segundo a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), foram 2.348 atestados apresentados por servidores. Na prática, isso significa que ao menos 6% de todos os servidores da capital precisaram se ausentar do trabalho em algum momento, no último mês.

Esses afastamentos afetam, principalmente, os trabalhadores da saúde que atuam na linha de frente no combate ao coronavírus, além dos professores da rede municipal, segundo o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Belo Horizonte (Sindibel).

Um dos motivos para esse adoecimento em massa entre os trabalhadores, segundo o presidente do Sindibel, Israel Arimar, foi o relaxamento das medidas de proteção contra a doença.

“Acompanhamos esse aumento significativo no número de afastamentos.Temos cobrado algumas ações por parte da prefeitura. Uma delas foi a volta do uso de máscara em locais fechados, o que já foi atendido”, destaca o presidente, citando a volta da obrigatoriedade do item que passou a valer nesta semana.

Um dos exemplos citados pelo presidente é o Centro de Saúde Mangueiras, na região do Barreiro, onde, segundo ele, três médicos estão afastados do trabalho em razão da contaminação pela Covid-19.

O período também foi de aumento nos afastamentos por doenças psiquiátricas, que atingiram 1% do total de trabalhadores da PBH em maio, com 364 registros no mês. Parte disso é justificada pela sobrecarga de trabalho causada pelos afastamentos por Covid, segundo explica o presidente do Sindibel.

“Nós estamos com uma nova onda de covid e isso gera o afastamento de muitos profissionais durante o período infectado. E isso traz como consequência o aumento da sobrecarga de trabalho, especialmente nas equipes onde já há essa defasagem de profissionais. Acaba criando um stress que é outro motivo para afastamento dos profissionais”, disse Arimar, que cobra da prefeitura a convocação de trabalhadores que já foram aprovados em concurso.

Doenças respiratórias em alta

No consultório, o médico generalista Diogo Umann percebeu aumento de casos de alteração infecciosa das vias aéreas superiores. Se em maio, muitos diagnósticos foram de Covid, na primeira quinzena de junho, mais da metade dos atendimentos foram ocasionados por síndromes gripais.

“Estamos vendo um quadro de gripe comunitária, os casos de Covid-19 são de 35% a 40% dos atendimentos. Os sintomas em geral são: congestão nasal, tosse seca, dores de garganta e febre”, explica. Os quadros levem costumam apresentar melhoras em uma semana e o especialista conta como ocorre a volta ao trabalho em casos de Covid.

“Pela orientação do Ministério da Saúde, a partir do início dos sintomas, a pessoa deve ficar sete dias isolada. Se melhorar os sintomas, 24 horas depois dos sete dias já pode retornar ao trabalho. Isso se estiver assintomático. Se estiver com sintomas, o exame precisa ser repetido”.

‘Trabalhamos em ritmo alucinante’

O enfermeiro Welson Alexandre Santos é um dos servidores que precisou se afastar do serviço por ter diagnóstico positivo para o coronavírus. Lidar diariamente com casos suspeitos da doença fez, conforme acredita, se infectar.

“Quando tive Covid lembro que estávamos atendendo em média 100 pessoas por dia para fazer testes. Acredito que possa ter relaxado um pouco pois o excesso de trabalho é tanto, que não nos permite cumprir todas as normas de precaução”, afirma.

Atuar na linha de frente da saúde neste momento de aumento de casos de Covid e de outras doenças respiratórias tem sido desafiador para os profissionais diante do afastamento dos colegas, já que a população acaba ficando prejudicada pela falta de profissionais e os que estão trabalhando precisam lidar com mais pacientes.

“A pressão psicológica se dá durante o ano inteiro, mas agora está ainda pior. Estamos trabalhando em ritmo alucinante, sem parar. Estamos cansados. Muitos têm adoecido por conta do stress com o trabalho e com a relação com o usuário. Já houve caso de pediatra que passou no concurso e após dar o primeiro plantão não quis permanecer”.

Diante deste cenário, o enfermeiro é categórico em afirmar: “a rede SUS de BH está muito estrangulada. É muita gente adoecida em busca de atendimento sem que consigamos dar respostas. Temos limite operacional e exaurimos nossas forças”, destaca.

Sindicância para apurar

O grande número de atestados médicos entregues por profissionais das unidades de saúde da capital mineira fez a PBH abrir sindicância para apurar. O Executivo municipal, na época, afirmou que não se tratava de um “pré-julgamento”, mas que o objetivo era “entender a situação para tomar as devidas providências”. As medidas não foram informadas sobre quais seriam.

Procurada pela reportagem, a PBH, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, informou que a Sindicância Administrativa está em andamento e tem prazo de 30 dias, sendo possível ser prorrogada pelo mesmo período. “No que se refere aos atestados, eles são objeto da Sindicância Administrativa, que tramita em sigilo. Terminando a sindicância o resultado será tornado público”, esclareceu.

Trabalhando doente

Alguns profissionais, mesmo estando doentes, têm ido para o trabalho. “O que mais tem é gente trabalhando doente”, alerta Neuza Freitas, diretora executiva do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sind-Saúde MG). Segundo a representante sindical, isso acontece por uma série de fatores, dentre eles para não deixar de atender a população.

Na administração estadual, foram 4.343 (1,3%) servidores afastados por licença saúde, no mesmo período (média de 140 por dia). No Estado há 322.173 trabalhadores. A média total é de 227 servidores municipais e/ou estaduais que não puderam comparecer ao trabalho por causa de alguma doença.

“Temos falta de pessoal e a sobrecarga é muito grande. A mudança de temperatura tem feito muitos terem gripe, no entanto, mesmo assim estão indo trabalhar, pois, se faltar sobrecarrega ainda mais”, destaca.

Neuza conta que os trabalhadores temem ainda a perda monetária, já que quando estão afastados, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) corta benefícios. “Todos os benefícios são cortados, ou seja, a perda monetária é grande. Sem falar também que a burocracia para entrega de atestados médicos é muito grande. Muita vezes, o trabalhador vai para o serviço doente”.

O que diz a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais

“A Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) informa que as unidades assistenciais possuem Núcleos de Saúde e Segurança do Trabalhador (NSST) próprios, que monitoram, recebem e encaminham atestados médicos entregues pelos servidores que necessitam de licença médica para tratamento de saúde.

Casos pontuais devem ser identificados para que se possa orientar os servidores, já que não há impedimentos nas unidades para entrega desses documentos. Quanto ao corte de benefícios, a Fhemig cumpre as legislações vigentes”.

 

 


Paola Tito